O ex-presidente do conselho de administração da Nissan Motor Carlos Ghosn disse que está processando a Renault, exigindo o pagamento de valores relativos ao seu desligamento da montadora francesa.
O jornal francês Le Figaro publicou nessa segunda-feira (13) uma entrevista com Ghosn, que agora está no Líbano após fugir do Japão.
Ghosn falou sobre seu desligamento da presidência do Conselho de Administração e CEO da Renault, em janeiro do ano passado, quando estava preso no Japão. Ghosn chamou a renúncia da Renault de "farsa". Ele disse que está exigindo todos os direitos relacionados à sua demissão.
Revelou que levou o caso a um tribunal francês em dezembro, exigindo que a companhia francesa pague a ele US$ 280 mil como indenização por sua saída da empresa.
O jornal também relata que Ghosn pretende buscar o pagamento de cerca de US$ 860 mil, aos quais teria direito como pensão e remuneração não paga.
A Renault se recusou a comentar a questão.
Prisão
Ghosn foi preso há 13 meses, em novembro de 2018, ao voltar ao Japão depois de um compromisso internacional. Após ser interrogado pela promotoria japonesa durante seis horas, o executivo foi levado ao centro de detenção de Kouchisho, nos arredores de Tóquio. Na época, a Justiça japonesa afirmou que Ghosn teria deixado de declarar US$ 44 milhões de sua renda.
Foi uma grande reviravolta na relação do executivo com o Japão. Antes de se tornar acusado de crimes de corrupção, ele era celebrado como um herói nacional, virando até personagem de mangá. Isso porque, antes de Ghosn ter arquitetado a fusão com a Renault, a Nissan era um negócio à beira da falência. Para completar, o executivo trouxe a Mitsubishi para a aliança, em 2016.
O executivo ficou preso por meses em uma cela de dez metros quadrados, cujas luzes eram acesas às 7h e invariavelmente se apagavam às 21h. Era nesse local que ele passava o dia todo, à exceção de 30 minutos que tinha para se exercitar.
O tratamento de choque da Justiça japonesa - que não precisa apresentar documentos para prender suspeitos uma vez que a promotoria decide denunciar uma pessoa - tem o objetivo de pressionar os acusados a confessar o crime.
Ghosn, porém, não foi persuadido. Pelo contrário: sempre negou as acusações. Ele saiu da prisão no dia 6 de março, após três meses e meio, mas voltou a ser detido por mais três semanas. Desde 25 de abril de 2019, encontrava-se em prisão domiciliar.
Desde então, a família tentava buscar apoio internacional para sua defesa. Em entrevista ao Estado, Carole Ghosn chegou a pedir a intervenção do presidente Jair Bolsonaro, que nunca veio. A França também optou por uma posição mais neutra em relação ao assunto. Os maiores sinais de apoio vieram sempre do Líbano.
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Fuga
Após oito meses em prisão domiciliar, morando em uma residência de alto padrão no centro de Tóquio, Ghosn empreendeu a fuga para Beirute. O que se sabe, até agora, é que Ghosn deixou a residência a pé, sendo captado pela última vez pelas câmeras de segurança no dia 29 de dezembro.
A partir desse momento, diferentes versões começam a aparecer. A mais aceita é a que Ghosn teria seguido então de trem até o aeroporto de Osaka - a mais de 400 km de Tóquio -, onde embarcou em um jato particular rumo a Istambul, na Turquia, e depois para Beirute, no Líbano.
Caso a viagem de trem tenha sido mesmo realizada, ela evidenciaria outro "furo" das autoridades japonesas, que ainda não conseguiram explicar como o executivo passou, identificando-se ou não, pela checagem de segurança do aeroporto de Osaka.
Ghosn viajou em dois jatos fretados da empresa turca MNG. A companhia diz que não tinha conhecimento do uso das aeronaves pelo ex-chefe da Renault-Nissan e acusou um funcionário de ter falsificado documentos para ocultar o nome de Ghosn como passageiro. O governo turco, no entanto, determinou a prisão de cinco pessoas supostamente envolvidas no caso.
A MNG é conhecida no mercado de aviação executiva como uma empresa que fecha os olhos para os negócios de seus clientes. Transportou, por exemplo, grande quantidade de ouro para a Venezuela para compensar a falta de liquidez financeira no país.
Empresa
A prisão de Ghosn, em novembro de 2018, ocorreu dias antes de uma reunião em que os termos da fusão entre a Renault e a Nissan seriam rediscutidos. O executivo era favorável a uma fusão irreversível das duas empresas.
A Nissan era contra esse acordo, uma vez que queria ganhar mais poder dentro da aliança (a Renault tem 40% das ações da Nissan, mas a japonesa possui apenas 15% dos papéis da francesa). Nos anos que antecederam a prisão de Ghosn, a Nissan vinha dando resultados melhores do que a Renault.
Toda a polêmica envolvendo Ghosn e outros executivos não tem feito bem à Nissan, que deve fechar o ano de 2019 com o menor lucro em 11 anos. No terceiro trimestre, a empresa reportou uma queda de 70% nos resultados, frustrando expectativas. As vendas da companhia estão no menor patamar em seis anos e suas ações caíram mais de 20% no último ano.
*Com Estadão Conteúdo e Agência Brasil